Há muito mais envolvido no tocante convite "saiamos a Ele", do que uma mera fuga dos absurdos da superstição ou dos esquemas de um lucrativo negócio religioso. Existem homens que conseguem explicar tudo, usando de poder e eloquência. São pessoas que se encontram muito longe de qualquer pensamento de atender ao chamado do apóstolo. Quando os homens estabelecem um "arraial", saem fazendo seus comícios que giram em torno de um padrão que contenha algum dogma importante da verdade, um credo ortodoxo, uma linha doutrinária mais clara, ou algum ritual esplêndido. É preciso ter muita inteligência espiritual para se discernir a verdadeira força que há nas palavras: "Saiamos", e muita energia espiritual e poder de decisão para agir.
Deve haver discernimento e ação, pois é perfeitamente evidente que a atmosfera de um arraial é perniciosa para a comunhão pessoal com um Cristo rejeitado. Nenhuma vantagem religiosa pode jamais substituir a perda dessa comunhão. Existe em nosso coração a tendência de nos deixarmos levar por um formalismo frio e estereotipado. Foi sempre assim na igreja professa. Talvez o formalismo tenha tido origem em um poder real; podem ter sido resultado de verdadeiras intervenções do Espírito de Deus. A tentação está em se manter um estereótipo quando o espírito e poder já não existem. Em princípio, isto é estabelecer um arraial.
O sistema judaico podia se gabar de ter tido origem divina. Um judeu podia triunfantemente apontar para o templo com todo o seu esplêndido sistema de adoração, seu sacerdócio, seus sacrifícios, seu mobiliário, e demonstrar que tudo aquilo havia sido dado diretamente pelo Deus de Israel. Ele podia citar o capítulo e versículo de tudo o que estava conectado com aquele sistema. Onde está o sistema, seja ele antigo, medieval ou moderno, que possa ter a mesma pretensão com igual peso de autoridade? E ainda assim, a ordem era: "Saiamos".
Este assunto tão profundamente solene diz respeito a todos nós. Estamos sempre prontos a abandonar a comunhão com um Cristo vivo e mergulhar em uma rotina morta. Daí o poder prático das palavras: "Saiamos pois a Ele". Não se trata de sair de um sistema para entrar em outro – de um conjunto de opiniões para outro – de um grupo de pessoas para outro. Não, mas sair de tudo aquilo que possa ser caracterizado como um arraial; sair a Ele que sofreu fora da porta. O Senhor Jesus está tão completamente fora da porta agora quanto estava quando sofreu lá há quase vinte séculos. O que foi que O levou para fora? O mundo religioso daquela época. O mundo religioso daquela época é, em espírito e princípios, o mesmo mundo religioso de hoje. O mundo continua sendo mundo. Cristo e mundo não têm nada em comum.
Em muitos de seus aspectos, o mundo cobriu-se com um manto de cristianismo, mas apenas o suficiente para se assegurar que seu ódio a Cristo possa, sob a superfície, se aprimorar para formas cada vez mais destrutivas. Não nos enganemos. Se andarmos com um Cristo rejeitado, acabaremos sendo também pessoas rejeitadas. Se nosso Senhor "padeceu fora da porta", não podemos esperar reinar do lado de dentro da porta. Se andarmos em Suas pegadas, para onde elas nos levarão? Certamente não será aos lugares elevados deste mundo ímpio e sem Cristo.
Seu caminho, que do mundo não granjeou sorrisos,
O levou à cruz, onde aguardavam terríveis castigos.
Ele é um Cristo desprezado - um Cristo rejeitado – um Cristo fora do arraial. Oh, querido cristão, saiamos a Ele levando Sua vergonha. Não busquemos o favor do mundo, já que ele crucificou e continua odiando nosso Amado, a Quem devemos tudo tanto agora como sempre. Ele é Aquele que nos ama com um amor que as muitas águas não poderiam apagar. Vivamos para Ele que morreu por nós. Enquanto nossas consciências repousam no Seu sangue, deixemos que as afeições de nosso coração se entrelacem com Sua Pessoa, de modo que nossa separação deste "presente século mau" não seja apenas uma fria questão de princípios, mas uma apaixonada separação pelo fato de Aquele, que é o Objeto de nossas afeições, não estar ali.
Que o Senhor possa nos livrar desse costume tão comum em nossos dias que é o de agirmos por interesse, atitude essa à qual não falta religiosidade, mas que é inimiga da cruz de Cristo. O que é necessário para permanecermos firmes contra essa terrível forma de mal não são opiniões peculiares, princípios especiais ou uma fria exatidão intelectual. Precisamos de uma profunda devoção à Pessoa do Filho de Deus; uma consagração de coração completa, corpo, alma e espírito, ao Seu serviço; um desejo sincero por Sua gloriosa vinda. Possamos, portanto, eu e você, nos unir em um só clamor que saia do fundo de nosso coração, a dizer: "Não tornarás a vivificar-nos, para que o Teu povo se alegre em Ti?" (Salmo 85.6).
C. H. Mackintosh, Christian Treasury, Ago. 94.
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